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domingo, 25 de março de 2012

A Vida de São João Clímaco

O Monte Sinai está historicamente ligado ao cristianismo. Foi o lugar indicado por Deus para entregar a Moisés as tábuas gravadas com os Dez Mandamentos. Assim, já no século IV, depois das perseguições romanas, vários mosteiros rudimentares foram ali construídos por numerosos monges que se entregavam à vida de oração e contemplação. Esses mosteiros tornaram-se famosos pela hospitalidade para com os peregrinos e pelas bibliotecas que continham manuscritos preciosos. Foi neste ambiente que viveu e atuou o maior dos monges do Monte Sinai, João Clímaco.
São João Clímaco nasceu em 580. De grande inteligência, formação literária e religiosa, ainda muito jovem, aos dezesseis anos, optou pelo deserto e viajou para o Monte Sinai, tornando-se discípulo num dos mais renomados mosteiros. Isso aconteceu depois de renunciar à fortuna da família e a uma posição social promissora. Preferiu um cotidiano feito de oração, jejum continuado, trabalho duro e estudos profundos. Só descia ao vale para recolher frutas e raízes para sua parca refeição e só se reunia aos demais monges nos fins de semana, para um culto coletivo.
O nome de São João Clímaco, Clímaco deve o seu cognome a um livro seu é uma alusão à palavra "klímax', que em grego significa escada. São João decidiu adotar este nome em virtude do livro escrito por ele mesmo, intitulado Escada para o Paraíso. A Escada é um resumo da vida espiritual, concebida para os solitários e contemplativos. Para Clímaco, a oração é a mais alta expressão da vida solitária; ela se desenvolve pela eliminação das imagens e dos pensamentos. Daí a necessidade da 'monologia', isto é, a invocação curta, de uma só palavra, incansavelmente repetida, que paralisa a dispersão do espírito. Essa repetição deve assimilar-se com a respiração.
Nesta obra ele explica que existem 30 degraus a serem galgados para que possamos atingir a perfeição moral. Este livro foi um grande sucesso na época e chegou até mesmo a influenciar monges e outros religiosos com sua conduta particular, tanto no Ocidente como no Oriente. A importância desta obra literária para a época pode ser notada na utilização do símbolo escada na arte bizantina.
São João Clímaco foi muito famoso como homem santo em toda a Palestina e Arábia. Conta-se que ele era palestino e na adolescência ingressou cm um mosteiro no Monte Sinai, onde passou a dedicar sua vida às orações e à meditação. Até os 35 anos, viveu desta forma, mas quando seu mestre faleceu resolveu encerrar-se cm uma cela e viver à moda dos monges do deserto: jejuando, orando e estudando a Bíblia.
Sua fama se espalhou e muitos peregrinos iam procurá-lo para aprender com seus ensinamentos e conselhos. Inicialmente eram apenas os que desejavam seguir a vida monástica, depois eram os fiéis que queriam uma direção espiritual e uma benção do monge, já tido em vida como santo.
O seu retiro eremítico desabrochou num amor ardente pelo próximo e a Deus. Certo dia, seu discípulo, Moisés, adormeceu debaixo de uma enorme pedra. João, orando em sua cela, viu que seu discípulo estava em perigo e orou a Deus por ele. Quando Moisés retornou mais tarde, se ajoelhou e agradeceu por ter lhe salvado da morte certa. Ele lhe contou como, em sonho, ouviu João lhe chamando e rapidamente se levantou. Naquele momento a pedra caiu. Se ele não tivesse se levantado, a pedra teria lhe esmagado.
Durante este novo período de sua vida São João Clímaco decidiu nunca mais comer carne, fosse ela vermelha ou branca. Também passou a sair de sua cela apenas para participar da Eucaristia, aos domingos.
Depois de quarenta anos de vida eremítica vivida no amor a Deus e ao próximo, anos durante os quais chorou, rezou, lutou contra os demônios. Já com 70 (sessenta) anos foi eleito por unanimidade abade geral de todos os eremitas da serra do Monte Sinai, muito embora preferisse continuar com sua vida isolada, e assim voltou à vida em comunidade no mosteiro. Nesta época construiu hospitais para a população mais pobre, ajudado pelo papa Gregório Magno.
Mas os últimos quatro anos de sua vida, nostálgico da vida eremítica, passou ao irmão monge no mesmo mosteiro, a guia da comunidade. Neste período de total isolamento ele escreveu muito e o que dele se conserva até hoje é um livro importantíssimo que teve ampla divulgação na Idade Média, "Escada do Paraíso", livro que lhe trouxe também o sobrenome Clímaco que, em grego, significa "aquele da escada". No seu livro ele estabeleceu trinta degraus necessários à subir para alcançar a perfeição da alma.
Trata-se de um verdadeiro manual, a síntese da doutrina monástica e ascética, para os noviços e monges, e para todo o cristão, onde descreveu, degrau por degrau, todas as dificuldades a ser vivida, a superação da razão e dos sentidos, e que as alegrias do Paraíso perfeito serão colhidas no final dessa escalada, após o trânsito para a eternidade de Nosso Senhor Jesus Cristo.
João Clímaco morreu no dia 30 de março de 649, amado e venerado por todos os cristãos do mundo oriental e ocidental, sendo celebrado por todos eles no mesmo dia do seu falecimento.

Fonte:

Revista Santo do Dia, Ed. Casa Dois, S. Paulo, 2001.

sábado, 17 de março de 2012

O Mistério da Nossa Vida Nova


"O bem-aventurado Jó, como figura da santa Igreja, ora fala em nome do corpo, ora em nome da cabeça. Mas, às vezes, ocorre que, quando fala dos membros, toma subitamente as palavras da cabeça. Eis por que diz: Sofri tudo isso, embora não haja violência em minhas mãos e minha oração seja pura(Jó 16,17). Sem haver violência alguma em suas mãos, teve também que sofrer aquele que não cometeu pecado e em cuja boca não se encontrou falsidade; no entanto, pela nossa salvação, suportou o tormento da cruz. Foi ele o único que elevou a Deus uma oração pura, pois mesmo em meio aos sofrimentos da paixão orou por seus perseguidores, dizendo: Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem! (Lc 23,34).

Quem poderá dizer ou pensar uma oração mais pura do que esta em que se pede misericórdia por aqueles mesmos que infligem a dor? Por isso, o sangue de nosso Redentor, derramado pela crueldade dos perseguidores,se transformou depois em bebida de salvação para os que nele acreditariam e o proclamariam Filho de Deus. Acerca deste sangue, continua com razão o texto sagrado: Ó terra, não cubras o meu sangue, nem sufoques o meu clamor (Jó 16,18). E ao homem pecador foi dito: És pó e ao pó hás de voltar (Gn 3,19). A terra, de fato, não ocultou o sangue de nosso Redentor, pois qualquer pecador, ao beber o preço de sua redenção, o proclama e louva e, como pode, o manifesta aos outros.

A terra não cobriu também o seu sangue porque a santa Igreja já anunciou em todas as partes do mundo o mistério de sua redenção. Notemos no que se diz a seguir: Nem sufoques meu clamor. O próprio sangue da redenção, por nós bebido, é o clamor de nosso Redentor. Por isso diz também Paulo: Vós vos aproximastes da aspersão do sangue mais eloqüente que o de Abel (Hb 12,24). E do sangue de Abel fora dito: A voz do sangue de teu irmão está clamando da terra por mim (Gn 4,10). O sangue de Jesus é mais eloqüente que o de Abel, porque o sangue de Abel pedia a morte do irmão fratricida, ao passo que o sangue do Senhor obteve a vida para seus perseguidores.

Assim, para que não nos seja inútil o sacramento da paixão do Senhor, devemos imitar aquilo que recebemos e anunciar aos outros o que veneramos. O clamor de Cristo fica sufocado em nós, se a língua não proclama aquilo em que o coração acredita. Para que esse clamor não seja sufocado em nós, é preciso que, na medida de suas possibilidades, cada um manifeste aos outros o mistério de sua vida nova".


São Gregório, o Grande, Bispo de Roma (Séc. VI)

quinta-feira, 15 de março de 2012

Há Espaço no Mundo de Hoje Para Pensar Religiosamente?

Ser Ortodoxo Hoje

"Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela". Convido a todos os cristãos a assistirem este vídeo que mostra a história de sofrimento, resistência e triunfo da Igreja Ortodoxa, testemunha viva de como a promessa que Cristo fez a Pedro é real e perene.



quarta-feira, 14 de março de 2012

A Pureza do Coração


Se me disserem: “Mostra-me o teu Deus”, dir-te-ei: “Mostra-me o homem que és e eu te mostrarei o meu Deus”. Mostra, portanto, como vêem os olhos de tua mente e como ouvem os ouvidos de teu coração. Os que vêem com os olhos do corpo, percebem o que se passa nesta vida terena, e observam as diferenças entre a luz e as trevas, o branco e o preto, o feio e o belo, o disforme e o formoso, o que tem proporções e o que é sem medida, o que tem partes a mais e o que é incompleto; o mesmo se pode dizer no que se refere ao sentido do ouvido: sons agudos, graves ou harmoniosos. Assim também acontece com os ouvidos do coração e com os olhos da alma, no que diz respeito à visão de Deus.

Na verdade, Deus é visível para aqueles que são capazes de vê-lo, porque mantêm abertos os olhos da alma. Todos têm olhos, mas alguns os têm obscurecidos e não vêem a luz do sol. E se os cegos não vêem, não é porque a luz do sol deixou de brilhar; a si mesmos e a seus olhos é que devem atribuir a falta de visão. É o que ocorre contigo: tens os olhos da alma velados pelos teus pecados e tuas más ações.

O homem deve ter a alma pura, qual um espelho reluzente. Quando o espelho está embaçado, o homem não pode ver nele o seu rosto; assim também, quando há pecado no homem, não lhe é possível ver a Deus. Mas, se quiseres, podes ficar curado. Confia-te ao médico e ele abrirá os olhos de tua alma e de teu coração. Quem é este médico? É Deus, que pelo seu Verbo e Sabedoria dá vida e saúde a todas as coisas. Foi por seu Verbo e Sabedoria que Deus criou o universo: 

"A Palavra do Senhor criou os céus, e o sopro de seus lábios, as estrelas" (Sl 32,6). 

Sua Sabedoria é infinita. Com a sua Sabedoria, Deus fundou a terra; com a sua inteligência consolidou os céus; com sua ciência foram cavados os abismos e as nuvens derramaram o orvalho.

Se compreenderes tudo isto, ó homem, se a tua vida for santa, pura e justa, poderás ver a Deus. Se deres preferência em teu coração à fé e ao temor de Deus, então compreenderás. Quando te libertares da condição mortal e te revestires da imortalidade, então serás digno de ver a Deus. Sim, Deus ressuscitará o teu corpo, tornando-o imortal como a tua alma; e então, feito imortal, tu verás o que É Imortal, se agora acreditares nele.


Sáo Teófilo, Bispo de Antioquia (Séc II)

terça-feira, 13 de março de 2012

O que a oração pede, o jejum o alcança e a misericórdia o recebe



“Há três coisas, meus irmãos, três coisas que mantêm a fé, dão firmeza à devoção e perseverança à virtude. São elas a oração, o jejum e a misericórdia. O que a oração pede, o jejum alcança e a misericórdia recebe. Oração, misericórdia, jejum: três coisas que são uma só e se vivificam reciprocamente. O jejum é a alma da oração e a misericórdia dá vida ao jejum. Ninguém queira separar estas três coisas, pois são inseparáveis. Quem pratica somente uma delas ou não pratica todas simultaneamente, é como se nada fizesse. Por conseguinte, quem ora também jejue; e quem jejua, pratique a misericórdia. Quem deseja ser atendido nas suas orações, atenda as súplicas de quem lhe pede; pois aquele que não fecha seus ouvidos às súplicas alheias, abre os ouvidos de Deus às suas próprias súplicas. Quem jejua, pense no sentido do jejum; seja sensível à fome dos outros quem deseja que Deus seja sensível à sua; seja misericordioso quem espera alcançar misericórdia; quem pede compaixão, também se compadeça; quem quer ser ajudado, ajude os outros. Muito mal suplica quem nega aos outros aquilo que pede para si. Homem, sê para ti mesmo a medida da misericórdia; deste modo alcançarás misericórdia como quiseres, quanto quiseres e com a rapidez que quiseres; basta que te compadeças dos outros com generosidade e presteza. Peçamos, portanto, destas três virtudes – oração, jejum, misericórdia – uma única força mediadora junto de Deus em nosso favor; sejam para nós uma única defesa, uma única oração sob três formas distintas. Reconquistemos pelo jejum o que perdemos por não saber apreciá-lo; imolemos nossas almas pelo jejum, pois nada melhor podemos oferecer a Deus como ensina o Profeta: Sacrifício agradável a Deus é um espírito penitente; Deus não despreza um coração arrependido e humilhado (cf. Sl 50,19). Homem, oferece a Deus a tua alma, oferece a oblação do jejum, para que seja uma oferenda pura, um sacrifício santo, uma vítima viva que ao mesmo tempo permanece em ti e é oferecida a Deus. Quem não dá isto a Deus não tem desculpa, porque todos podem se oferecer a si mesmos. Mas, para que esta oferta seja aceita por Deus, a misericórdia deve acompanhá-la; o jejum só dá frutos se for regado pela misericórdia, pois a aridez da misericórdia faz secar o jejum. O que a chuva é para a terra, é a misericórdia para o jejum. Por mais que cultive o coração, purifique o corpo, extirpe os maus costumes e semeie as virtudes, o que jejua não colherá frutos se não abrir as torrentes da misericórdia. Tu que jejuas, não esqueças que fica em jejum o teu campo se jejua a tua misericórdia; pelo contrário, a liberalidade da tua misericórdia encherá de bens os teus celeiros. Portanto, ó homem, para que não venhas a perder por ter guardado para ti, distribui aos outros para que venhas a recolher; dá a ti mesmo, dando aos pobres, porque o que deixares de dar aos outros, também tu não o possuirás”.


Pedro Crisólogo, Bispo de Ravena (Sec. V)

segunda-feira, 12 de março de 2012

Acerca da Humildade

São Basílio, o Grande
"Não se glorie o sábio de seu saber, não se glorie o forte de sua força, nem o rico de suas riquezas (Jr 9,22). Qual é então o verdadeiro motivo de glória e em que consiste a grandeza do homem? Quem se gloria – diz a Escritura – glorie-se nisto: em conhecer e compreender que eu sou do Senhor (Jr 9,23). A nobreza do homem, a sua glória e a sua dignidade consistem em saber onde está a verdadeira grandeza, aderir a ela e buscar a glória que procede do Senhor da glória. Diz efetivamente o Apóstolo: Quem se gloria, glorie-se no Senhor. Estas palavras encontram-se na seguinte passagem: Cristo se tornou para nós, da parte de Deus, sabedoria, justiça, santificação e libertação, para que, como está escrito, “quem se gloria, glorie-se no Senhor” (1Cor 1,31). Por conseguinte, é perfeito e legítimo nos gloriarmos no Senhor quando, longe de orgulhar-nos de nossa própria justiça, reconhecemos que estamos realmente destituídos dela e só pela fé em Cristo somos justificados. 
É nisto que Paulo se gloria: desprezando sua própria justiça, busca apenas a que vem por meio de Cristo, ou seja, a que se obtém pela fé e procede de Deus; para assim conhecer a Cristo, o poder de sua ressurreição e a participação em seus sofrimentos, configurando-se à sua morte, na esperança de alcançar a ressurreição dos mortos. Aqui desaparece todo e qualquer orgulho. Nada te resta para que te possas gloriar, ó homem, pois tua única glória e esperança está em fazeres morrer tudo que é teu e procurares a vida futura em Cristo. E como possuímos as primícias desta vida, já a iniciamos desde agora, uma vez que vivemos inteiramente na graça e no dom de Deus. 

É certamente Deus quem realiza em nós tanto o querer como o fazer, conforme o seu desígnio benevolente(Fl 2,13). E é ainda Deus que pelo seu Espírito nos revela a sabedoria que, de antemão, destinou para nossa glória. Deus nos concede força e resistência em nossos trabalhos. Tenho trabalhado mais do que os outros – diz também Paulo – não propriamente eu, mas a graça de Deus comigo (1Cor 15,10). Deus nos livra dos perigos para além de toda esperança humana. Experimentamos, em nós mesmos, – diz ainda o Apóstolo – a angústia de estarmos condenados à morte. Assim, aprendemos a não confiar em nós mesmos, mas a confiar somente em Deus que ressuscita os mortos. Ele nos livrou, e continuará a livrar-nos, de um tão grande perigo de morte. Nele temos firme esperança de que nos livrará ainda, em outras ocasiões (2Cor 1,9-10)."

São Basílo, o Grande, Bispo de Cesareia (sec. IV)

sábado, 10 de março de 2012

Busquemos a Deus, Único Bem Verdadeiro


Homilia de Santo Ambrósio de Milão..h at Paróquia Ortodoxa São Mateus by Antonio Mateus 2


"Onde está o coração do homem está também o seu tesouro; pois Deus não costuma negar o bem aos que lhe pedem. Porque o Senhor é bom, e é bom sobretudo para os que nele esperam, unamo-nos a ele, permaneçamos com ele de toda a nossa alma, de todo o coração e de todas as forças, para vivermos na sua luz, vermos a sua glória e gozarmos da graça da felicidade eterna. Elevemos nossos corações para esse bem, permaneçamos e vivamos unidos a ele, que está acima de tudo quanto possamos pensar ou imaginar; e concede a paz e a tranqüilidade perpétuas, uma paz que ultrapassa toda a nossa compreensão e sentimento.

É esse o bem que tudo penetra; todos vivemos nele e dele dependemos; nada lhe é superior, porque é divino. Só Deus é bom e, portanto, o que é bom é divino e o que é divino é bom; por isso se diz no salmo: Vós abris a mão e todos se fartam de bens (Sl 103,28). É, com efeito, da bondade de Deus que nos vêm todos os bens, sem nenhuma mistura de mal. Esses bens são os que a Escritura promete aos fiéis, dizendo: Comereis dos bens da terra (Is 1,19).

Nós morremos com Cristo e trazemos em nosso corpo a morte de Cristo, para que também a vida de Cristo se manifeste em nós. Portanto, já não é a nossa própria vida que vivemos, mas a vida de Cristo: vida de inocência, vida de castidade, vida de sinceridade e de todas as virtudes. Também ressuscitamos com Cristo; vivamos, pois, unidos a ele, subamos com ele, a fim de que a serpente não possa encontrar na terra o nosso calcanhar e feri-lo. Fujamos daqui. Podes fugir com o espírito, embora permaneças com o corpo; podes ficar aqui e estar ao mesmo tempo junto do Senhor, se teu coração estiver unido a ele, se teus pensamentos se fixarem nele, se percorreres seus caminhos, guiado pela fé e não pelas aparências, se te refugiares junto dele – que é nosso refúgio e nossa força, como disse Davi: Eu procuro meu refúgio em vós, Senhor, que eu não seja envergonhado para sempre (Sl 70,1).

Já que Deus é o nosso refúgio, e Deus está nos céus e no mais alto dos céus, é preciso fugir daqui para as alturas onde reina a paz, onde repousaremos de nossas fadigas, onde celebraremos o banquete do grande sábado, como disse Moisés: O repouso sabático da terra será para vós ocasião de festim (Lv 25,6). Descansar em Deus e contemplar as suas delícias é, na verdade, um banquete, cheio de alegria e felicidade. Fujamos, como os cervos, para as fontes das águas. Que a nossa alma sinta a mesma sede de Davi. Qual é esta fonte? Escuta o que ele diz: Em vós está a fonte da vida (Sl 35,10). Diga minha alma a esta fonte:Quando terei a alegria de ver a face de Deus? (Sl 41,3). Porque a fonte é o próprio Deus."

sábado, 3 de março de 2012

QUE DEVO FAZER DURANTE A GRANDE QUARESMA?


Extrema Humilhação

Muitos de nós têm a consciência de que a oração, o jejum e as obras de misericórdia para com o próximo são as três virtudes cristãs básicas que, particularmente durante a Grande Quaresma, oferecemos a Deus; mas também reconhecemos que em razão de estarmos envolvidos no mundo, não as conseguimos praticar com a mesma diligência de uma disciplina monástica. Por isto os grandes mestres espirituais nos animam a que neste tempo façamos o máximo esforço, mas, também, que nos deixemos guiar pelo nosso Pai espiritual para que não nos sintamos frustrados ou erremos por não termos buscado orientação.


FAZER O QUE SE PODE
"Ante a Tua cruz adoramos e nos prostramos, ó Senhor"
Quando buscamos um conselho prático sobre o que deve ser feito na Quaresma, a melhor orientação é: “Fazer o que se pode ser feito”. Isto de maneira alguma significa fazer o mínimo, nem o que é mais radical. Simplesmente devemos ser honestos para conosco mesmo e para com Deus e fazer aquilo que a nossa capacidade física e espiritual é capaz de fazer para alcançar aquilo que necessitamos. Sabemos que a Oração, o Jejum e a Caridade para com o próximo constituem o essencial. Portanto, os exercícios espirituais são ferramentas eficazes para que melhoremos as coisas que são básicas. Contudo, se a abstinência dos alimentos derivados de animais põe em risco a nossa saúde ou se nos induz a perverter o seu sentido (como por exemplo: fazer do jejum um meio para perder excesso de peso), devemos entender que tal jejum não agrada a Deus. A cada dia aumenta no mundo a consciência de que um período de abstinência de produtos animais contribui para uma maior elevação espiritual - além de melhorar o nosso caráter e a saúde física e emocional.
Dá o melhor de ti aos demais (do teu tempo, do teu caráter, dos teus conselhos, etc), sem pedir nada em troca ou esperar qualquer recompensa. Tens a consciência de que a oração, o jejum e as boas obras devem ser feitas de forma discreta? Somente assim é que podemos agradar a Deus. Por isto se alguém que não conhece esta disciplina te convidar para comer ou festejar, forçando-te inconscientemente a quebrar o jejum, não o leve a mau, mas aproveita a ocasião para lhe explicar com amor como tu vivencias a tua fé em Deus e o que muitos Ortodoxos praticam durante este período; assim, (quem sabe?) esta pessoa poderá ser atraída a praticar a Fé, estimulada por teu exemplo. Recorda, portanto, que a única finalidade e propósito da Grande Quaresma é vivenciar o profundo amor de Deus, amor este que celebramos em Sua Morte e ressurreição por nós e por aqueles que nos cercam. Criar um ambiente no qual predomine um legalismo vazio e absurdo está muito longe do que Cristo requer de nós.


CERTAS SEMANAS
Vivificante Cruz
Outra sugestão que devemos observar é a prática dos antigos Pais da Igreja, ou seja, a de escolher determinadas semanas para um jejum mais rigoroso.
Por exemplo: A primeira e a terceira semana da Grande Quaresma e a Semana Santa, podem ser mais rigorosas do que as demais. Pode-se sugerir, por exemplo, que na primeira e terceira semana se faça uma restrição total às carnes e todo produto animal; do azeite na quinta semana e, na sexta semana de todos os doces. Se conseguirmos praticar tal disciplina, não temos dúvidas de que alcançaremos resultados muito positivos e que todo o tempo investido nesta batalha humano-espiritual se converta num tempo muito inspirativo e frutífero. Talvez, seja o melhor tempo da nossa vida.


O QUE PODEMOS FAZER
Aqui propomos algumas ações que podem ajudar a viver mais claramente a Grande Quaresma:

  • Desligue televisão, rádio, reprodutores de áudio, etc, durante toda a Grande Quaresma ou por um período designado. Podes assistir noticiários ou programas educativos;
  • Procura fugir de compromissos sociais - a não ser aqueles que se mostrarem importantes para o teu próximo - e investe este tempo em cuidar dos necessitados;
  • Examine e avalie cada aspecto de tua vida familiar, trabalho, sociedade, valores, etc, e questiona-te sobre tuas ações que estão fora da vontade de Deus e dos ensinamentos de Cristo;
  • Pergunta a ti mesmo como estás em relação ao amor, a verdade, a honestidade, a pureza, ao perdão, a paz, misericórdia, fome e sede de Deus, sabedoria, conhecimento espiritual.
  • Em nome de Jesus perdoa a todos os que te ofenderam e busca o perdão daqueles que ofendestes (se for possível), e procura evitar mal-entendidos.
  • Deixa de lado os gastos supérfluos e dá a outrem parte dos teus recursos (não das tuas sobras), dádivas que sejam frutos do teu sacrifício, ajuda a Igreja, as instituições sociais, e, sobretudo, não te descuides daqueles que estão próximos a ti .
  • Jejua estritamente. Abstêm-te de carne (ou come apenas o indispensável para adaptar teu jejum ao teu trabalho), contudo, sem dar-te a luxos. Por exemplo: comer “sushi” (um prato caro) por causa do jejum. Não comente com ninguém ou discutas sobre o “tipo” de jejum. Deixa-te guiar por teu Pai Espiritual e, junto com ele, define o que te convém, e ademais, não julgues o jejum de ninguém (dos que o praticam ou não);
  • Ore todos os dias em tua casa obedecendo uma regra de oração que esteja ao teu alcance;
  • Leia as Sagradas Escrituras, brevemente, mas de forma sistemática. Podes usar o Lecionário ou se não tens como adquiri-lo, recomendamos meditar na Carta de João, Romanos 12 - 14; S. Mateus 5 - 7, e S. João 14 -17.
  • Procura ser fiel aos ensinos de nosso Senhor Jesus Cristo em cada palavra, não os adaptando às tuas comodidades ou interpretando-os conforme as tuas conveniências;
Participa dos Serviços Litúrgicos que a tua igreja oferece a cada semana da Quaresma, especialmente a Liturgia dos Dons Pressantificados, Akáthistos a Mãe de Deus e Divina Liturgia Dominical. Confessa-te e recebe a Santa Comunhão frequentemente.


PAZ E ALEGRIA
Se praticarmos estas coisas sem espírito de or- gulho, autocompaixão, sem irritação ou dor, alcançaremos uma paz genuína, em comunhão com Deus e com aqueles que nos cercam.
Durante a primeira semana da Quaresma, se reza o Gran- de Cânon de Santo André de Creta, o qual consiste nu- ma longa lista de versículos de caráter penitencial, basea- dos em temas bíblicos e, aos quais os Fiéis respondem a cada um deles dizendo: “Tem piedade de mim, ó Deus, tem piedade de mim”.
Às sextas-feiras da Quaresma se reza um ofício denomina- do Akathistos a Virgem Maria, Theotokos. É uma oração em louvor à Mãe de Deus, cuja autoria se atribui a São Romano, o Melode. Durante as quatro primeiras sextas- feiras, se reza uma quarta parte do ofício, até completá-lo. Na quinta sexta-feira se reza o ofício completo.
Geralmente o dia de sábado, inclusive fora da Grande Quaresma, é o dia que a Igreja dedica à recordação dos falecidos, pois o sábado é o dia no qual Deus abençoou a vida na Terra. Todavia, devido ao pecado, este dia agora simboliza toda a vida terrena que conduz à morte. Cristo, o Senhor, permaneceu morto durante todo o dia do sábado, “descansando de todas as Suas obras”, e “venceu a morte pela morte”. É assim, então, que na Igreja de Cristo do Novo Testamento, o sábado se faz um dia especial para recordar os falecidos e oferecer súplicas a Deus pela salvação deles.
O primeiro sábado da Grande Quaresma é dedicado à memória de São Teodoro de Tiro. Os sábados seguintes são dedicados à memória dos Fiéis Falecidos. Os hinos litúrgicos que se entoam nesses dias rogam por todos os Fiéis Falecidos. Também se reza o Responso pelos Falecidos, nomeando-os individualmente. Outras orações e litanias também são agregadas à Divina Liturgia, a qual, tal como as leituras das Sagradas Escrituras, fazem referência aos falecidos e à salvação em Cristo.